Vítima do incêndio na boate Kiss conheceu seu amor no hospital
Emanuel Pastl, sobrevivente do incêndio na Boate Kiss casa com enfermeira que cuidou dele e trabalha como especialista em prevenção de incêndios
Em meio a tragédia da boate Kiss surge uma relação de cuidado profissional que acabou em casamento.
O incêndio da boate Kiss, no Rio Grande do Sul, foi uma das maiores tragédias brasileiras. No dia 27 de janeiro de 2013 o uso de fogos de artifício dentro de um ambiente fechado gerou um incêndio que matou 242 pessoas e deixou 680 feridos.
Dentre os feridos estava Emanuel Pastl. Por ser filho de bombeiro e ter passado por diversas situações de risco com ele, conseguiu manter a calma e sobreviver ao incêndio. Mas o fato de ter inalado muita fumaça tóxica, fez com que fosse entubado durante 10 dias.
Ele foi levado ao hospital da Ulbra, em Canoas, onde ficou em tratamento. Apesar da calma, o acidente também lhe rendeu algumas queimaduras. Para cuidar delas ficou sob o cuidado da enfermeira Mirélle Bernardini.
Ela estava mergulhada no cuidado dos pacientes vítimas da tragédia na boate. Além do amor à profissão, estar ali era um meio de esquecer um drama familiar pelo qual vinha passando.
Seu pai foi vítima de um homicídio. O que já era motivo suficiente para lhe desestabilizar, somou-se ao fato de que seu avô, de 90 anos, inconformado com a morte do filho, entrou em depressão e morreu três meses depois.
Das chamas ao fogo da paixão
Ambos vinham de um momento de turbulência. Em meio ao contato médico, antes de sair de férias, ela lhe cedeu o número para que pudesse ajudar à distância o paciente que estava tendo alta.
Os cuidados médicos abriram portas para uma atenção especial que vinha de ambas as partes e eles encontraram refúgio um no outro e o que era uma simples relação profissional se transformou em uma linda história de amor e de superação.
“Após as férias, ela retornou para o hospital de Canoas, onde eu morava e ainda moro. Nos encontramos, começamos a sair mais vezes e nos apaixonamos. Então veio o namoro, o casamento em janeiro de 2018 e estamos juntos até hoje. Temos uma filha, a Antônia, que nasceu em setembro de 2019”, detalha Emanuel.
“Foi uma união por fatos difíceis. Quando ele apareceu no hospital, eu ainda estava ‘digerindo’, de luto. Foi conversando sobre as depressões da vida, sobre como é difícil perder alguém, se reerguer. Eu até citei nos meus votos do casamento que no momento mais difícil das nossas vidas a gente se conheceu e se reergueu juntos”, acrescenta Mirélle relembrando a tormenta que o casal enfrentava na época.
Se recupera a vítima, nasce o herói
Emanuel hoje é um especialista em incêndios a serviço de uma empresa americana e trabalha no combate daquilo que ele sofreu e ressalta que o risco de uma nova tragédia semelhante àquela pela qual passou é mais próxima do que imaginamos.
“Hoje ainda existem muitas edificações que potencialmente colocam pessoas em risco. A própria sociedade já não adere. Tem sempre esse sentimento de economizar. Não se atua na prevenção, é sempre na emergência.”, afirmou ele.
Conhecer na pele o que é ser vítima de uma incêndio fruto de negligência dá autoridade ao Emanuel, que agora dedica sua vida para que pessoas não passem mais pela mesma situação e faz alerta:
“Outras Kiss, estatisticamente, vão acontecer. Depois da Kiss, ainda aconteceram incêndios como o do Hospital do Badim, no Rio (2020), no Ninho do Urubu (2019), no prédio da Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre (2021), e no Museu Nacional (2018). O Brasil é um dos países no mundo com mais mortes decorrentes de incêndios. A raiz do problema é muito ampla, não é uma só. A legislação, por exemplo, é confusa. No Rio Grande do Sul, ela nem está completamente pronta.”
Formado em História, entusiasta da literatura, apaixonado por artes.